No Brasil, quando aproveitamento do biogás surge a partir de iniciativas do setor público, o potencial de transformação social e as melhorias nos indicadores ambientais para uma determinada região são evidentes. Mas para isso, é necessário o desenho de políticas públicas mais eficazes, visto que este o aproveitamento do potencial de produção de biogás ainda não está longe de ser explorado em sua totalidade.
Em 2019, na cidade de Entre Rios do Oeste, a Central de Bioenergia a Biogás foi inaugurada. O projeto concebido por uma chamada de P&D da Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL) mudou a vida dos moradores com a geração de energia elétrica utilizando o biogás produzido em propriedades suinocultoras do município. O projeto foi patrocinado pela Copel e executado pelo CIBiogás e pelo Parque Tecnológico Itaipu (PTI).
As propriedades rurais, vistas como as unidades responsáveis por produzir o biogás, são conectadas a uma rede coletora de 20,6 quilômetros que transporta o biogás até uma Central Termelétrica de 480kW de potência instalada com dois grupos motogeradores. Na Minicentral, o biogás é transformado em energia elétrica, que por sua vez compensa o consumo de energia dos prédios públicos do município. A cidade conta hoje com pouco mais de 4 mil habitantes e ainda tem muito a oferecer para o desenvolvimento do biogás no Estado. Segundo a Agência de Defesa Agropecuária do Paraná (ADAPAR), a cidade concentra um plantel de 155 mil suínos. O município é o 4º maior produtor de suínos do estado do Paraná e o 16º do Brasil, representando um grande potencial para a geração de energia a partir do biogás no interior da região. De modo geral, o case de Entre Rios representa um modelo de negócio exemplar para ser reproduzido em outros lugares do Brasil, visto a satisfação dos moradores com a iniciativa e com o grande estímulo da bioeconomia, visto que a oportunidade fomenta a necessidade de serviços especializados e novos suprimentos, tal como a demanda por mão de obra especializada e fornecedores do ramo. Atualmente o projeto trata 215 toneladas de resíduos que são transformados em 4.600 m³/dia de biogás, capaz de proporcionar aos suinocultores envolvidos, até 5 mil reais de acordo com a sua produção e porte de propriedade. A geração de energia elétrica é de 3.000 MWh/ano, comprovando o bom exemplo do case.
Sendo assim, vê-se a eficácia de estudos focados na viabilidade e pretensões de cada projeto. O case de Entre Rios representa um modelo de negócio muito indicado para ser replicado em regiões com o potencial de produção de suínos similar, e isso, em grande parte do Brasil, é encontrado em regiões rurais, no interior dos estados. As discussões da Conferência do Clima das Nações Unidas em Glasgow, Escócia – a COP-26, trouxeram à tona a importância das metas para a redução da camada de ozônio provocada pela emissão de gases de efeito estufa (GEE). O reforço das metas que devem ser cumpridas pelo Brasil até 2030 confirma a importância da luta contra as mudanças climáticas, visto que a conferência definiu as iniciativas que mitigariam o aumento máximo de 1,5°C na temperatura média da Terra em comparação com o período pré-industrial.Nessa mesma linha, o Instituto Amazônia 21 foi lançado na intenção de apoiar empreendimentos com a adequação de práticas sustentáveis e abordagem ESG (Ambiental, Social e Governança). A iniciativa estrutura projetos que têm capacidade de gerar um impacto socioambiental positivo e que acolhe o Biogás dentro das suas ações como uma alternativa capaz de aplicar o uso da fonte na região da Amazônia legal, que tem um grande potencial para o desenvolvimento da bioeconomia focada em regiões agropecuárias e no comércio local.
O CIBiogás, em conjunto com a Federação da Indústria de Rondônia (FIERO), lançou um estudo que identificou o potencial do estado do biogás a partir da Fração de Resíduos Sólidos Urbanos, sendo este de 31,7 milhões de Nm³ biogás /ano. O número pode gerar 59 GWh/ ano de energia elétrica e abastecer cerca de 19 mil residências apenas com o biogás, além de poder gerar 16,8 milhões de metros cúbicos de biometano. O estudo foi apresentado no lançamento da Amazônia+21, assim como outras pesquisas, na intenção de promover novas ações no desenvolvimento socioeconômico da região. Ações como essa, fomentam não só a evolução do biogás no território nacional, mas também a confiança das governanças estaduais e municipais na transformação que essa fonte juntamente com iniciativas como a da Amazônia+21, podem modificar o cenário sustentável do Brasil, que vem sendo tão prejudicado a cada ano devido às queimadas e ao agronegócio não sustentável. O biogás promove um forte elo entre todos os pontos importantes para o bom progresso do Brasil, um dos países com maior potencial para produção do biogás, mas que ainda desperdiça muitos resíduos. De acordo com a Nota Técnica, Panorama do Biogás no Brasil 2020, o número de plantas em operação entre 2019 e 2020 apresentou um crescimento de 22% a.a, revelando uma forte tendência a investimentos em biogás. Ainda espera-se que o Panorama referente aos resultados de 2021 apresente números ainda maiores.Baixe a Nota Técnica
O Programa Paraná Energia Rural Renovável, o Renova-PR, foi lançado em 2020 no Paraná, um dos estados brasileiros com maior atividade agrícola. O programa dá apoio à geração distribuída de energia elétrica por fontes renováveis de geração de biogás e biometano em unidades produtivas rurais paranaenses, tal como consta em Lei.No final de 2021, o Governador Ratinho Júnior, anunciou novas medidas para incentivar a geração de energia renovável no âmbito agropecuário do Paraná, sendo assim, dois decretos foram divulgados, um que disponibiliza R$ 1 Bilhão em créditos tributários para empresas e cooperativas que possuem crédito de ICMS no Paraná e outro que autoriza a subvenção das taxas de juros para tomadores de crédito, produtores rurais e agroindústrias em linhas de crédito com recursos próprios do sistema financeiro.A importância dessa iniciativa que contemplam inicialmente as ações no agro, abrem portas para ainda mais atividades que reciclam os resíduos orgânicos urbanos para que sejam transformados em biogás. A mudança, acontece literalmente de dentro para fora, incentivando mais investimentos em contextos públicos e privados e sempre em prol do biogás e suas vantagens para a sociedade. Em Foz do Iguaçu os horizontes já começaram a se expandir. No segundo semestre de 2020, a Comitiva da Prefeitura de Foz visitou a UD Itaipu para conhecer o trabalho do Centro e a eficiência causada pela aplicação de um biodigestor em locais com grande geração de resíduos, a fim de aumentar a responsabilidade socioambiental com um programa de gestão de resíduos no município, reforçando a relevância do biogás no setor público.A ideia é que biodigestores de escala doméstica possam ser instalados nas escolas da rede municipal, visto que as máquinas podem acumular até 10kg de resíduos diariamente, transformando-os em biogás, que é capaz de gerar gás para as cozinhas e também fertilizante para as áreas verdes das escolas.
Com a abertura de propostas para a aquisição dos biodigestores para as escolas, acredita-se que, além do reaproveitamento de resíduos para a geração de energia elétrica e térmica, o prefeito Chico Brasileiro enxerga a oportunidade como uma chance de aumentar a vida útil do aterro sanitário, devido a redução de lixo.Segundo o infográfico elaborado pela Associação Brasileira de Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais (ABRELPE) e pela Associação Brasileira de Biogás (ABiogás), em 2018, 91% de todo o resíduo sólido urbano foi coletado no Brasil, mas apenas 59% deste total foi destinado corretamente aos aterros sanitários para serem transformados em biogás. No Sul do Brasil, o volume de RSU nos aterros em 2018, correspondiam a mais de 5 milhões de toneladas/ano, porém apenas 535 milhões de Nm³/ano foram captados no mesmo ano. No total, o volume de RSU em 2018 nos aterros sanitários brasileiros, somaram 42.266.759 toneladas/ano. Outra vantagem identificada pelas lideranças e envolvidos na iniciativa, foi o aumento do gás de cozinha, o que consequentemente, torna-se um fator econômico quando gerado a partir do biogás, estimulando a bioeconomia da cidade. O município também pretende instalar os biodigestores em regiões mais carentes, além de unidades de valorização de materiais recicláveis. Ao final, entende-se a importância do acolhimento do biogás no setor público. As iniciativas que permeiam a fonte, sejam de institutos ou de projetos exclusivos, estimulam a curiosidade por uma alternativa tão benéfica para a sociedade. Os biodigestores de escala doméstica são capazes de transformar o local onde foram instalados, e em uma perspectiva maior, otimizar a visão financeira de uma cidade ou negócio, resultando em uma população muito mais consciente e sustentável, devido à atitudes que surgiram primeiramente pela coragem de investir em inovação.