PROJETOS DE INVESTIMENTO EM GÁS NATURAL SÃO ENQUADRADOS COMO PRIORITÁRIOS PARA EMISSÃO DE DEBÊNTURES
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Patrícia de Albuquerque de Azevedo 

Carolina do Rêgo Lopes Fonseca[1]



No dia 27 de março de 2024, foi publicado no Diário Oficial da União o Decreto nº 11.964/2024, que regulamenta os critérios e as condições para enquadramento e acompanhamento dos projetos de investimento considerados como prioritários na área de infraestrutura ou de produção econômica intensiva em pesquisa, desenvolvimento e inovação, para fins de emissão de debêntures incentivadas, previstas na Lei nº 12.431/2011, e de debêntures de infraestrutura, tratadas na recém publicada Lei nº 14.801/2024.

 

O decreto prevê um rol taxativo dos setores na área de infraestrutura que poderão ser enquadrados como prioritários. Destaca-se que o texto da norma estabelece expressamente a possibilidade de projetos de energia, majoritariamente de baixa ou sem emissões de carbono, serem enquadrados como prioritários para fins de emissão das referidas debêntures. Entre eles foram incluídos projetos de (i) geração por fontes renováveis, transmissão e distribuição de energia elétrica; (ii) gás natural; (iii) produção de biocombustíveis e biogás, exceto de fase agrícola; (iv) produção de combustíveis sintéticos com baixa intensidade de carbono; (v) hidrogênio de baixo carbono; (vi) captura, estocagem, movimentação e uso de dióxido de carbono; e (vii) dutovias para transporte de combustíveis, incluindo biocombustíveis e combustíveis sintéticos com baixa intensidade de carbono.

 

Especificamente no setor de gás natural e biogás, ressalta-se que tanto projetos de gás natural, quanto projetos de produção de biocombustíveis (neste caso, excluída a fase agrícola do processo nos projetos de geração de biomassa) foram enquadrados como projetos sujeitos a prioridade. Com relação ao biogás, também foram enquadrados como projetos sujeitos a prioridade a aquisição de ônibus elétricos e híbridos a biocombustível ou biogás, para sistema de transporte público coletivo urbano ou de caráter urbano. Por outro lado, no que se refere aos projetos de gás natural, entende-se que estes estariam restritos aqueles voltados para geração de energia. Contudo, não houve detalhamento de quais setores da cadeia do gás natural (desde que com a finalidade de geração de energia) poderiam ser contemplados com a prioridade.

 

Para fins de enquadramento como prioritário, é necessário que os referidos projetos atendam aos critérios e condições gerais estabelecidos no Decreto e em respectiva portaria ministerial setorial na data de apresentação do requerimento de registro da oferta pública dos valores mobiliários com benefícios fiscais. Note que nesse contexto, o regime tributário e benefício no investidor são distintos para as debentures incentivadas e para as debêntures de infraestrutura, sendo vedada a cumulação dos benefícios tributários previstos na Lei 12.431/2011 (debentures incentivadas) e na Lei 14.801/2024 (debentures de infraestrutura) simultaneamente para uma mesma emissão.  Entretanto, como não há vedação na emissão dos dois instrumentos para o mesmo projeto, poder-se-ia cogitar na respectiva emissão desde que o somatório dos valores captados em ambas as emissões não seja superior ao total das despesas de capital do projeto de investimento.

 

Assim, apesar de regulamentar o enquadramento e acompanhamento dos projetos de investimento considerados como prioritários, o Decreto deixa a critério das portarias ministeriais setoriais a serem publicadas os critérios e condições complementares para enquadramento nos setores prioritários, conferindo, ainda, a possibilidade de que tais normas limitem o enquadramento a determinados subsetores ou tipos específicos de projetos.

Neste aspecto, não foi incluído no texto do Decreto o procedimento para que seja garantida prioridade aos projetos, de modo que este ficará a critério dos respectivos Ministérios, através da regulamentação complementar.

 

Não obstante, a norma recém-publicada detalha providências a serem tomadas pelo interessado previamente ao requerimento do registro da oferta pública das debêntures para fins de acompanhamento e fiscalização pelo Ministério setorial e pelo Ministério da Fazenda (e suas Secretarias). Assim, enquanto a competência para acompanhamento e supervisão da implementação do projeto cabe aos Ministérios setoriais, ao Ministério da Fazenda e à Receita Federal caberá o acompanhamento e a avaliação dos benefícios fiscais concedidos à emissão dos valores mobiliários.

Apesar da participação ativa dos Ministérios setoriais na elaboração de regulamentação complementar e no acompanhamento da implementação dos projetos, o Decreto desburocratiza o procedimento ao dispensar a exigência de aprovação ministerial prévia para fins de obtenção da prioridade. Tal liberação, contudo, não se aplica aos projetos que envolvam serviços públicos de titularidade dos entes subnacionais.

 

Salienta-se que, muito embora o Decreto nº 11.964/2024 estabeleça taxativamente os setores na área de infraestrutura passíveis de enquadramento como prioritários para fins de emissão de debêntures incentivadas e de infraestrutura, a norma define, ainda, uma regra de prioridade entre tais setores durante a instrução processual. Desse modo, terão preferência na avaliação do requerimento de registro de oferta pública pela CVM e nos trâmites para aprovação prévia dos projetos nos Ministérios setoriais, quando exigida, os projetos que proporcionem benefícios ambientais ou sociais relevantes, desde que atestados por relatório de avaliação externa específica para o tipo de emissão.

 

Por fim, tendo em vista que o Decreto nº 11.964/2024 revogou expressamente o Decreto nº 8.874/2016, que regulava anteriormente a matéria, foi estabelecido como regra de transição que os projetos aprovados na vigência da regulamentação anterior e que não se enquadrem nos critérios e nas condições estabelecidas na nova norma poderão ser objeto de emissão de novas debêntures incentivadas no prazo de noventa dias, contados da data de publicação do Decreto. Findo este prazo, sem prejuízo da fruição dos benefícios fiscais para as debêntures já emitidas, não poderão ser emitidas novas debêntures destinadas à implementação de projetos que não se enquadrem nos novos critérios e condições estabelecidos no novo Decreto nº 11.964/2024.


[1] Advogadado escritório Kincaid Mendes Vianna Advogados, membro do BiogasClub.

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